sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Coração de Retalhos

I. Subitamente vi-te. Conheci-te. Dei-me a conhecer. O meu coração inchou, bateu, aquis saltar cá para fora, dizer-te como o fazias vibrar. Não o podendo fazer, reservou, para ti, um cantinho – só para ti! E esse cantinho foi-se enchendo, a pouco e pouco, com memórias e carinhos. Depois, não tão subitamente, o inchaço foi desaparecendo, as memórias perdendo cor, e o cantinho desintegrou-se… Os carinhos passados mantiveram-se guardados, bem como algumas memórias, mas outros pedaços do cantinho foram preenchidos por desapontamento, por promessas quebradas e por lágrimas. Esse cantinho era teu, e vai continuar a ser, com os seus pedaços bons e os seus pedaços maus. Mas tem a tua cor, e o teu cheiro e o teu nome. É teu ainda.

II. Bastou uma noite para mudar tudo. A ti conhecia-te, via-te, não sabia se me vias a mim. Nessa noite viste. E gostaste. E eu também! E mais uma vez o meu coração se inflamou e tentou, desta feita, entregar-se a ti. Mas não podia e então decidiu, novamente, reservar um espaço. Um espaço só para ti, afastado do espaço escurecido que já uma vez tinha aberto. E, tal como antes, para uma outra cor, um outro cheiro, um outro nome, deixou que esse pedaço de si se fosse preenchendo a pouco e pouco com as tuas memórias e os teus carinhos. Mas o espaço reservado não estava suficientemente afastado do anterior, e o meu coração tinha ainda em si, talvez num outro pedaço mais escondido, uma lembrança de mágoa e, lutando consigo mesmo, decidiu ser melhor fechar o teu cantinho antes que algo fizesse com que ele se desintegrasse como o anterior. Tentativa não muito bem sucedida pois, uma vez por outra, lá se abria o cantinho para nova memória – e foi num desses momentos que levaste ao encerramento completo. Mas foi abrupto, inesperado, e escureceu esse teu canto e adicionou um pouco mais de mágoa a esse pedaço inominado do coração.

III. Não sei se um novo pedaço de coração vai reservar-se novamente. Presumo que sim. Nesse momento terei três pedaços distintos, marcados especificamente por três cores distintas, três cheiros distintos, três nomes cravados. Mais uma vez esse pedaço pode fechar-se. Mais uma vez um novo pedaço abrir-se-á. De momento tenho dois bocadinhos preenchidos de bom e de mau, cada qual com a sua cor, e com muitos recortes de memórias e carinhos e desilusões. E depois tenho o resto do coração, ainda intacto e por inchar. E escondido, algures, um pedaço onde guardo a mágoa. É o meu coração de retalhos. Cada um tem o seu, cada qual com os seus pedaços, os seus recortes, as suas cores. Este é o meu!